Futebol do interior gaúcho pede apoio do Estado para sobreviver
Felipe Prestes
“Perguntei que ruínas eram aquelas, me responderam que era o estádio do Grêmio Santanense”. Fundado em 1913, campeão estadual em 1937, o Grêmio Football Santanense é hoje mais um vulto que paira moribundo no futebol do interior gaúcho. A descrição sobre a situação atual do clube foi dada por Jair Rizzo, presidente do São Paulo de Rio Grande, que se mantém a duras penas na segunda divisão estadual – com cerca de R$ 2 milhões de dívidas. Dirigentes de clubes do interior gaúcho se reuniram em audiência pública na Assembleia Legislativa nesta quarta-feira (24).
“Santiago, São Borja, Uruguaiana, São Gabriel, Cruz Alta não têm mais clubes disputando o campeonato gaúcho. Passo Fundo não tem mais clubes na primeira divisão. Os dois clubes de Bagé (Guarany e Bagé) caíram para a terceira divisão, que está sendo criada”, completou Julio Cesar Ausani, presidente do Riograndense de Santa Maria, mostrando que a situação do Grêmio Santanense é mais regra que exceção.
A audiência foi uma iniciativa do deputado Alexandre Lindenmeyer (PT), que já presidiu o tradicionalíssimo Sport Club Rio Grande, fundado em 1900 e considerado o clube mais antigo do país ainda em atividade. O parlamentar propõe que o auxílio do Estado aos clubes deixe de ser “paternalista” e passe a ser uma política pública, que pode envolver, segundo ele, educação, inclusão, cultura, turismo, entre outras áreas.
O ineditismo de discutir a situação dos clubes do interior no Legislativo gaúcho atraiu a presença de vários dirigentes de futebol, sindicatos ligados ao esporte e, até, torcedores. Também marcaram presença integrantes do governo do Estado, como o secretário do Esporte, Kalil Sehbe; o representante da Casa Civil, Bruno Scheidemandel; e o assessor da diretoria do Banrisul, Irton Freitas. O presidente da Federação Gaúcha de Futebol (FGF), Francisco Noveletto também compareceu à audiência.
Jogo Aberto
Alexandre Lindenmeyer articula com o governo uma proposta de política pública já intitulada de “Jogo Aberto”. A audiência serviu de subsídio para compor esta proposta, mas ela já tem um ponto básico: aumentar os patrocínios de estatais para os clubes do interior, desde que eles cumpram contrapartidas. “Os clubes que quiserem apenas patrocínio, já estão recebendo patrocínio do Banrisul. Os clubes que quiserem mais recursos precisam pensar em contrapartidas”.
As contrapartidas mais óbvias são o investimento dos clubes na formação de jogadores e na inclusão social por meio de escolinhas. Os clubes também poderiam realizar campanhas entre seus torcedores para captar correntistas para o Banrisul, por exemplo. Lindenmeyer revelou que o governo já formou um grupo para discutir o futebol como política pública e ele deseja ampliar a discussão para temas como o turismo e a cultura.
O petista afirmou que a discussão inclui até mesmo a participação da TVE, que enviou um representante à audiência. “Existe um diálogo para que possamos dar visibilidade aos clubes que estão à margem, por meio da TVE. Pode ser desde a transmissão de jogos, ou pela divulgação, dando enfoque à cultura dos municípios, à história dos clubes”, afirmou o parlamentar.
O representante da Casa Civil, Bruno Scheidemandel, sinalizou que o governo pode estabelecer patrocínios aos clubes não apenas com o Banrisul, mas com outras estatais, como Sulgás e Corsan.
Críticas dos clubes
Representantes dos clubes se mostraram contentes com a disposição de parlamentares e do governo, mas criticaram a distribuição atual do patrocínio estatal. “A dupla Grenal ganha milhões do Banrisul”, lembrou o presidente do São Paulo-RG, Jair Rizzo. “Não é razoável que o banco dos gaúchos não possa contribuir razoavelmente com os clubes”, questionou Julio Cesar Ausani, do Riograndense-SM. O dirigente lembrou que clubes pequenos têm a mesma carga tributária dos grandes e sugeriu que lhes fosse permitido aderir ao Simples.
A questão da visibilidade dos clubes, que pode ser ampliada pela TVE, também foi tocada pelos dirigentes. Com franqueza, Ausani falou que muitos jovens em Santa Maria sequer conhecem a existência do tradicional Riograndense e criticou a cobertura que a imprensa faz, dando muito mais espaço a Grêmio e Internacional. “É muito mais fácil cobrir só dois clubes”.
O dirigente criticou o fato de a FGF estar gerindo os direitos de imagem da Segunda Divisão do futebol gaúcho e pediu que os clubes (a esta altura o presidente da federação já havia saído da audiência) detenham os direitos. Também ironizou a discrepância de tratamento da FGF com os clubes da primeira e da segunda divisão. “Não conseguimos fazer o nosso congresso técnico em Buenos Aires, quem sabe um dia consigamos fazer em Rivera”.
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