Cidade de Felipão pretere
filho ilustre por "zagueiro mais macho do Sul".
Postado por: UOL.com.br 20/06 6:10
Scolari saiu cedo de Passo
Fundo para ganhar o mundo no futebol, mas hoje em dia a terra natal do
treinador da seleção não manifesta qualquer torcida especial pelo
filho ilustre. Os laços do comandante do penta com o munícipio no interior do Rio
Grande do Sul existem, inegavelmente, mas a terra do Sport Club Gaúcho prefere
exaltar a memória do “zagueiro mais macho do Sul”, que um dia teria ofuscado a
carreira do esforçado defensor Luiz Felipe.
Mesmo em dia de seleção em
campo na Copa, como na última terça-feira, Passo Fundo torce sem dedicação
exclusiva para Felipão, sem qualquer menção aparente nas ruas. O menino do
bairro do Boqueirão deixou a cidade na juventude sem defender o Sport Club
Gaúcho, cuja sede antiga ficava a apenas alguns metros da casa da família
Scolari. Na prática, bastava atravessar a rua para estar noestádio Wolmar
Salton. Mas quis o destino que o futuro treinador fosse construir a carreira em
São Leopoldo e Caxias, enquanto que Daison Pontes fazia fama como o beque mais
temido do interior do Rio Grande do Sul.
Com um pouco de exagero,
há quem acredite que Scolari não teria tido espaço no Gaúcho por causa da
fama local de Daison e então saiu para começar pelo Aymoré de São
Leopoldo. Mais tarde, com a camisa do Caxias, Felipão voltou à rua de sua
infância, mas desta vez na condição de adversário.As lendas do futebol
gaúcho contam que os embates entre Felipão e Daison Pontes eram memoráveis, mas
a vantagem costumava ficar para o zagueiro de Passo Fundo.
Certa vez o representante
do Gaúcho foi chamado pela RevistaPlacar como o o jogador mais
indisciplinado do Brasil, após acumular 18 expusções em um período. A mais
célebre delas aconteceu em 1974, contra o Inter de Santa Maria, quando agrediu
um juiz que marcara dois pênaltis contra seu time. Acabou suspenso por 18
meses.“A gente tinha um grande
ídolo, chamado Daison Pontes. Ele era um jogador essencialmente técnico. O
pessoal fala que ele era violento, muito violento, mas ele era muito técnico. E
o pessoal fala que foi por isso que ele (Felipão) não conseguiu vaga aqui no
Gaúcho, por isso que foi embora daqui”, diz Gilmar Rosso, atual presidente
do clube de Passo Fundo.“Olha, rapaz, era uma
briga de foice, como se diz aí. Tem um amigo nosso que me relatou que Felipão e
Daison era um choque de cachorro grande, no bom sentido da palavra. Saía fumaça
dos dois”, acrescenta o dirigente.Herói cult das canchas do
interior gaúcho,Daison costumava dizer que, para
ser campeão estadual, o time precisava passar pelo Alviveverde de
Passo Fundo. Pontes chegou a desfrutar da amizade de Felipão depois da
aposentadoria e morreu na cidade em junho de 2012, vítima de um AVC. Foi
enterrado com a camisa do Gaúcho, “como se estivesse entrando em campo”, pediu,
em vida.“O jogador mais famoso da
cidade é o Bebeto, ‘canhão da serra’, tem até dois livros sobre ele. Mas o
Daison tem mais o folclore, por ter sido um zagueiro duro, por ter feito uma
boa dupla por muito tempo com o irmão dele, João”, relata Luiz Carlos
Schneider, jornalista do ‘O Nacional’.
Não se sabe ao certo se
Felipão teve o Gaúcho como time de infância, apesar da proximidade física em
relação ao estádio do clube. Mas antes de ir ao Aymoré em São Leopoldo o futuro
treinador integrou um time amador do bairro do Boqueirão, chamado de F-8, ao
lado do primo Wiss Gabriel.“Ele saiu muito moço de
Passo Fundo. Ainda tem amigos daqui, da mesma faixa etária dele. Mas foi para
Canoas, onde o pai parece que montou um negócio de combustíveis. Se afastou, e
investe em imovéis lá em Canoas. E tem a identificação com Caxias, o ponto marcante
da sua carreira esportiva”, afirma Schneider, do ‘O Nacional’.O técnico da seleção ainda
tem parentes em Passo Fundo, com irmãs e primos. A mãe, Dona Cecy Leda, faleceu
em dezembro de 2012 e está enterrada em um cemitério local. No último dia 10 de
junho, Felipão perdeu o sobrinho Tarcísio João Schneider, morto aos 48 anos em
um acidente de carro na cidade. A preparação da seleção para a
estreia na Copa impediu a presença do treinador no funeral.
Felipão foi vaiado como adversário na rua de casa
O atual técnico da seleção
brasileira descobriu cedo que o futebol é um mundo à parte, às vezes
desvinculado das normas convencionais de convívio social. Foi assim que um dia
experimentou provocações quando pisou no acanhado estádio Wolmar Salton como
jogador do Caxias, “inferno” que intimidava até antigas estrelas de Inter e
Grêmio.“Eu me recordo como
espectador e torcedor do Gaúcho. Uma vez ele veio jogar com o Caxias, entrou
meio caminhando em campo. O pessoal da arquibancada xingava. O Felipão, a gente
tratava como todos os inimigos que tratávamos, entre aspas. Tentando afetar o
seu moral, desestabilizá-lo emocionalmente. Mas a gente trata aqui gente como
gente. Terminava o jogo, segue a vida de todos, como pessoas. Violência no
futebol não combina”, conta o atual presidente do Gaúcho.
CLUBE DE PASSO FUNDO SE
ERGUE APÓS CRISE
Hoje o velho alçapão do
Gaúcho de Passo Fundo é uma terra arrasada. Depois de uma disputa jurídica, o
clube acabou perdendo o terreno em um leilão. Agora, após um período de
reconstrução financeira, a agremiação prepara a construção de uma arena
particular para 10 mil pessoas em outra área da cidade.Gilmar Rosso assumiu a
presidência do Gaúcho em 2010, com o clube no fundo do poço. Hoje, depois de sanear
as questões financeiras, trabalha no projeto do novo estádio e com o
planejamento de reconduzir o time à elite do futebol estadual em 2018, ano do
centenário.Para sair do papel, a
arena precisará de envolvimento de entusiastas do clube. A direção espera que
simpatizantes possam ajudar com compra de sacos de cimento, por exemplo.
O
presidente até fala em ajuda de Felipão, mas quer evitar que a possibilidade
soe como oportunismo.“Se quiser ajudar, não só
ele como qualquer outro com vínculo com o Gaúcho, estamos à disposição. Mas não
pedimos para ninguém. Sabemos que o Felipão é de Passo Fundo, tem raízes na
região, tem família. Mas nunca fomos lá pedir dinheiro, é proibido.
Se o
Felipão quiser, vai ser de bom grado, a gente agradece”, diz Rosso.
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